Cássia Raquel

por Sherif Awad

Cássia Raquel


-Fui criada na igreja evangélica onde meu pai era Pastor. Ele incentivava muito o ensino de música e investia nas crianças. Então, todo evento, tinha apresentação dos grupos. Como ele era compositor e antes de se converter tocava na bateria de Carnaval, ele me ensinava muito e casa. Tenho um primo que é solista do Teatro Municipal de SP há quase 30 anos e isso me inspirou mais ainda.

-Passei a frequentar o teatro relativamente tarde. Assim que eu comecei a estudar clarinete, ficava ciente das programações e tinha mais companhia para conhecer talentos da geração. Até então, basicamente eu conhecia cantores gospel onde destaco duas: Shirley Carvalhaes e Cristina Mel. São meus pilares vocais. Tem domínio vocal e até hoje se mantém no auge. Duas vozes agudas mas uma é mais doce e outra mais estridente. Costumo dizer que eu equilibrei meus ouvidos assim. Até hoje canto o repertório delas.

Cássia Raquel

-Estudar música exige disciplina e atualização contínua; infelizmente no nosso país não há valorização da nossa profissão e frustrações nos acompanham no cotidiano. Os cursos são caros, instrumentos também e muitos lugares vão oferecer cachês abaixo do mínimo com a justificativa de estar “divulgando o trabalho”. Entrei no mercado de musicais numa época em que se faziam audições para encontrar novos rostos e provei minha competência e profissionalismo e ganhei o respeito das pessoas. Ser artista é muito mais mais que cantar ou tocar bem. É um conjunto. Estou numa fase intensa de lutar pelos nossos direitos, me informando continuamente. Se posicionar faz parte e quem fica em cima do muro comete um erro gravíssimo.

-Ser bem sucedida não é necessariamente ser famosa. Já trabalhei com os melhores e não os decepcionei. As críticas a minha pessoa sempre foram positivas. Sempre lembram do meu nome para convites diversos. Pra mim, isso é muito mais valioso do que viver num falso glamour do tapete vermelho. Não serei hipócrita em dizer que ter carreira internacional não é relevante e o retorno financeiro não seja válido, mas exige um maior amadurecimento para administrar a vida e conseguir se manter nesse patamar. Vai acontecer na hora certa. Enquanto isso, cuido da minha saúde física e mental para que eu desfrute melhor a minha carreira.

-É mais comum ver homens dirigindo trabalhos grandes. Quando uma mulher assume esse papel, vemos outro tipo de cuidado com as narrativas além de incentivar elencos majoritariamente femininos exemplo o musical Elza). Somos nós por nós. Estou estudando para ser diretora musical. Ganhar prêmios, trabalhar com bastidores, preparar vozes, quero ocupar esse espaço também.

Cássia Raquel

-O teatro musical resistiu bem neste cenário onde temos que brigar pelo óbvio. Muita gente se arriscando em produzir conteúdos inéditos, com pouco patrocínio, principalmente a comunidade negra. Contar nossas próprias histórias, ampliar o público, horários alternativos, não depender de franquias, mesmo que pra isso as temporadas sejam menores. O mais importante é que está acontecendo.

-Componho desde pequena e durante a pandemia resgatei letras da minha adolescência em parceria de amigos diversos. Queria que eles fizessem a leitura da forma que eles enxergavam a música para eu também criar uma nova visão. Gosto de postar nas minhas redes, principalmente no meu canal do YouTube. Geralmente, as letras surgem conforme tenho inspiração. Mas hoje, consigo produzir em demanda. Estou escrevendo em um musical do zero e isso me tira da zona de conforto. Ter que pensar nos tons, nos personagens e suas características, frases que vão fixar na cabeça do ouvinte, combinar com o roteiro, pensar nas repetições, às vezes descartar uma obra inteira e refazer… é bem diferente mas bem dinâmico. 

-Gosto de trabalhar com pessoas que eu me identifico em vários discursos. Gente que me respeita e não me convida como plano B. Tem muita gente que só lembra de mim pra ‘tapar buraco’ ou trabalhos com pouco orçamento. Ignoro essas mensagens. Não é que nunca mais eu vá fazer trabalhos sem ônus ou com poucos recursos, mas vejo muita gente que não consome meu trabalho mas acha que eu devo aceitar qualquer coisa. Tem produções que eu não tenho a menor vontade de voltar a trabalhar. Lugares que só me trouxeram dor de cabeça, que esfregava na nossa cara o tempo todo que deveríamos ser gratos por estar ali onde muita gente faria pela metade. Lugares onde presenciei muitos assédios de diversos tipos. Prefiro ganhar pouco ao lado de gente respeitosa e que permita diálogo do que ambientes que nós tratem como ralé. 

-Fazer mais 2 pós graduações e investir em projetos pessoais, como escrever mais músicas inéditas, reativar o que eu tinha interrompido, ampliar meu estúdio onde dou aulas… casar e viajar bastante. 

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